Escolha das candidaturas ainda está no 1º tempo, mas a oposição vai estar unida nas eleições

Publicado 23/01/2014

 Um dos maiores articulares dos quadros do PT goiano e também um dos maiores opositores ao governo de Marconi Perillo (PSDB), o deputado Luis Cesar Bueno tem na cabeça a estratégia para que a oposição vença as eleições de 2014: não cometer o erro de 2006 — quando PMDB e PT lançaram candidaturas próprias — e se espelhar em 2010, quando por pouco Iris Rezende, apoiado pelos petistas, por pouco não ganhou o duelo com o governador tucano. Para isso, ele prega com todas as forças a união, desde o primeiro turno, dos dois partidos e das demais siglas adversárias do PSDB.

 
Na análise de Luis Cesar, a recuperação da imagem de Marconi como gestor não significa automático ganho eleitoral. Ele aposta que vários fatores devem influenciar negativamente o eleitor em relação ao governador, entre eles a crise de energia elétrica, o avanço da violência, o tempo de mandato e o caso Cachoeira.
 
Na análise interna sobre a disputa da cabeça de chapa, o presidente do diretório municipal do PT é diplomático: apesar de seu correligionário Antônio Gomide, prefeito de Anápolis, colocar claramente seu nome na disputa, Luis Cesar diz que todos da oposição devem apostar em seus nomes e depois, juntos, escolher o que tem maiores condições de vencer a disputa com o PSDB e seus aliados. “O PT está na mesa com um nome que tem projeção e viabilidade eleitoral. Queremos o apoio para ele, mas também poderemos apoiar outro, desde que tenha densidade eleitoral, capacidade de aglutinação e liderança”, pondera.
 
Elder Dias — Antônio Gomide [prefeito de Anápolis] será o pré-candidato oficial do PT?
Pode ser.
 
Elder Dias — Pode ser ou vai ser?
Pode ser, desde que tenha o apoio do PMDB. Nós trabalhamos e vamos continuar trabalhando pela tese da unidade das oposições. Que­re­mos ter, unidos no mesmo palanque, de preferência ainda no primeiro turno, os partidos que dão sustentação à presidenta Dilma e que fazem oposição ao governo do PSDB em Goiás. Esse é o projeto macro. Estamos aos 15 minutos do primeiro tempo e o jogo termina dia 28 de fevereiro, com uma prorrogação no mês de março. Acreditamos que até lá é preciso construir vários ce­nários — com Gomide, com Jú­nior Friboi (PMDB), com Iris Re­zen­de (PMDB), além de trabalhar quem seria vice e quem seria candidato ao Senado. Também queremos tentar incorporar a terceira via. Se for possível, queremos Vanderlan Cardoso (PSB), longe do DEM, vin­do para uma composição. Temos de desenhar vários cenários. O diálogo é demorado, mas é o caminho mais rá­pido para um entendimento. Uma coisa é fato: a oposição vai estar unida em Goiás nas eleições de 2014.
 
Cezar Santos — A declaração de Gomide, ao dizer que Paulo Garcia [prefeito de Goiânia] só fala por ele ao advogar a prioridade do PMDB de encabeçar a chapa em Goiás, não abre uma crise dentro do PT?
O PT não tem definição sobre candidatura a governador em 2014. Não definimos nome como partido político. Temos, sim, uma definição de lançamento de um nome que represente a unidade das oposições. O PT terá seus encontros e suas convenções, nos quais, como partido, deliberaremos se vamos lançar candidatura própria ou apoiar um nome de outro partido. Mas a linha estabelecida pela direção nacional — e também pela orientação que a direção estadual está dando — é trabalhar a unidade das oposições em Goiás. O PT está na mesa com um nome que tem projeção e viabilidade eleitoral. Nós queremos o apoio para nosso nome, mas também poderemos apoiar outro nome, desde que mantenha alguns critérios: densidade eleitoral, capacidade de aglutinação e que tenha liderança. Se juntarmos um nome com esses critérios, teremos condições de ter apoio ao nosso nome. Quem tem postulado essa indicação é o prefeito de Anápolis, Antônio Gomide, que tem feito uma gestão com brilhantismo e competência, e tem projeção eleitoral. Eu, pessoalmente, trabalharei para manter a unidade da oposição em Goiás. Se conseguirmos com nosso nome, ótimo; se não conseguirmos, vamos ver se é possível apresentarem outro nome que supere o nosso para discutir a possibilidade de apoio. O que é extremamente importante é manter a unidade dos partidos de oposição em Goiás.
 
Elder Dias — Eu vou reformular a pergunta: o PT, neste jogo da negociação, vai colocar o nome de Antônio Gomide como pré-candidato oficial?
Nós temos colocado o nome do prefeito Antônio Gomide e o do prefeito Paulo Garcia para a elaboração de cenários, em uma articulação com os partidos políticos. Estamos fazendo isso. E agora é a hora de medir a preferência dos nossos nomes. Estamos em um momento de estabelecer cenários. O jogo tem 90 minutos e, talvez, prorrogação. Nós estamos nos 15 minutos do primeiro tempo, ainda. Não podemos retirar nosso nome da mesa de negociação no início do jogo. É até importante para fortalecer  processo de negociação dos cenários.
 
Elder Dias — Mas a questão, voltando para Goiânia, é que parece que tem havido, como discurso pelo menos de parte do PT, de buscar mais a defesa de candidatura do PMDB, de dizer que a preferência é do PMDB, ao contrário de jogar esse jogo colocando com força um nome do PT na mesa. Está jogando mais em prol do PMDB do que para o próprio partido. O sr. entende dessa forma?
Nós queremos apoiar o nome que vá vencer as eleições e que represente a oposição ao projeto do PSDB, em Goiás. Nas pesquisas o nome do ex-prefeito Iris Rezende aparece muito bem colocado, apesar de oficialmente o PMDB já ter a pré-candidatura do empresário Júnior Friboi. O PT apresenta à mesa de negociações Antônio Roberto Gomide e Paulo Garcia. Vamos até março verificar qual é o nome que aglutina mais, que estabelece um cenário vitorioso. Eu vejo muita preocupação da mídia, com os nomes da oposição. Mas pergunto aos próprios jornalistas se eles estão preocupados com o fato do PSDB até hoje não ter candidato ao governo. Do governador Marconi Perillo (PSDB), nos bastidores da Assembleia Legislativa, ouvimos muito que ele não é candidato, que seria o vice-governador [José Eliton, do PP]. Acho que a pauta sobre a oposição não é balanceada com a mesma intensidade no questionamento das candidaturas do lado do governo.
 
Euler de França Belém — Mas é porque jornalismo não trabalha com coisas falsas.
O candidato do governo é Marconi, exceto se acontecer um terremoto.
 
Cezar Santos — Dilma também não se diz candidata. O sr. já ouviu ela dizer que é?
A decisão é do PT. O Lula já disse, o PT já definiu. Ela não pode falar porque ela é presidente.
 
Euler de França Belém — Por que parte do PT prefere apoiar Iris Rezende a Júnior Friboi e Antônio Gomide?
O PT quer apoiar um nome que vá vencer as eleições.
 
Euler de França Belém — Não, parte do PT quer apoiar Iris Rezende.
O PT quer apoiar um nome que vá vencer as eleições (enfático). Nós vamos definir isso nos nossos fóruns de decisão interna. Agora, nesse elaborar de cenários existem diversas posições, mas que não são oficiais por parte do PT. Nós temos na mesa a candidatura de Gomide e Paulo; queremos construir uma unidade da oposição com nossos nomes. Caso se comprove um cenário que venha a vencer as eleições em condições melhores do que os nossos, nós podemos apoiar também, por meio de decisões. Nós queremos a unidade. Uma coisa é concreta: PT, PMDB e demais partidos que fazem oposição ao governo de Marconi precisam estar unidos. E acho que essa união tem de se dar já para o primeiro turno.
 
Euler de França Belém — Pelo que o sr. falou, ficou claro que o candidato será do PMDB. Porque o sr. disse “nós vamos tentar convencê-los a apoiar o candidato do PT”. Eles já falaram que não apoiam. O candidato é do PMDB.
Sim, mas se a candidatura deles não decolar e a nossa estiver em me­lhores condições, nós queremos tencionar o máximo possível para que a candidatura seja nossa. Porém, isso não significa fechar a questão, dizer que vai haver rompimento. Não ha­ve­rá rompimento entre PT e PMDB. Nós estaremos juntos em 2014. Ou com a cabeça de chapa do PT ou com a cabeça de chapa do PMDB.
 
Cezar Santos — A declaração de Gomide vai radicalmente contra isso: “Nós não temos compromisso com a aliança do PT com PMDB”.
A declaração do prefeito de Anápolis foi clara. Ele falou que nós precisamos manter a unidade da oposição para governar Goiás. O PT precisa do PMDB.
 
Elder Dias — Mas essa unidade não pode ser feita para o segundo turno? Por que não forçar um segundo turno com um PT com uma candidatura forte e o PMDB com uma candidatura forte?
Existem alguns que defendem esse cenário de sair três ou quatro candidaturas da oposição e, depois, unir no segundo turno. Eu sou contra, porque entendo que as divergências de campanha se acentuam muito e geram um fator desaglutinador. Nós temos de dar uma demonstração de maturidade politica para unir as oposições e ir para o primeiro turno com as oposições unidas. Vamos trabalhar para isso.
 
Cezar Santos — Percebe-se claramente que há dentro do PT um jogo, hoje, entre dois grupos. O grupo de Paulo Garcia e o grupo de Antônio Gomide. O sr. percebe isso ou não?
 
Euler de França Belém — Só complementando: o que a gente percebe é que a alternativa a Friboi, dentro desse grupo de Paulo Garcia, não é Antônio Gomide, mas Iris Rezende. Ou seja, se Friboi não emplacar, não virá um petista, mas Iris.
Nós estamos debatendo nossos nomes, sem rompimento. Não queremos rompimento. O nome que tiver a melhor perspectiva eleitoral será o nome que nós vamos apoiar. Então, vamos estabelecer vários cenários: o cenário com Iris, o cenário com Júnior, o cenário com Go­mide ou, talvez, com um nome que nem esteja aí. Há esse entendimento entre os partidos para manter a oposição unida. Entretanto, se nós não tivéssemos a viabilidade de vencer as eleições, nós não estaríamos nessa articulação intensa entre os partidos para indicar uma cabeça de chapa. Se nós estamos fazendo isso é porque temos viabilidade para vencer as eleições em Goiás. As pesquisas mostram um desgaste muito grande de Marconi Perillo. Há uma recuperação da imagem do governo — lenta, mas existe —, mas isso não sig­nifica recuperação da projeção elei­toral. Portanto, a perspectiva de eleição de um nome da oposição é real.
 
Cezar Santos — Portanto, não há uma contenda, hoje, na política dentro do PT, entre os grupos de Paulo e de Antônio Gomide?
Não, o PT está unido. Nós vamos trabalhar a unidade das oposições. Nós queremos a unidade das oposições, teremos de trabalhar para o PT manter sua unidade e vou fazer isso, como presidente do partido de Goiânia.
 
Euler de França Belém — O sr. falou algo interessante sobre a possibilidade de outro nome. Qual, por exemplo? O sr. acha que poderia ser Edward Madureira, ex-reitor da UFG?
Acho que é um bom nome. Nós temos vários nomes que podem vir a disputar. O momento é de estabelecer esses cenários e debater com eles em janeiro, fevereiro e até início de março. Aí, nós conseguiremos construir uma viabilidade real. Até lá, teremos um momento de muita efervescência política, não dentro do PT apenas, mas no PMDB também. Vocês já estão vendo uma efervescência no PMDB, como há no PT. Isso é tradicional nos períodos pré-eleitorais.
 
Euler de França Belém — Pelo que eu percebo, o cenário mais aproximado será um candidato do PMDB, com um vice do PT e um senador do PMDB, embora a orientação nacional do PT seja para o partido eleger senadores.
Poderemos ter esse cenário ou outro, com governador do PT, vice de outro partido, um senador do PMDB; podemos ter outro ainda, com governador do PMDB, vice do PT e senador de outro partido. É es­se comparativo de cenários que te­mos de trabalhar agora e ter a maturidade e a grandeza suficiente, assim como capacidade de articulação, para, ao analisar os vários cenários, trabalhar a unidade das oposições. Consegui­re­mos fazer isso, já tivemos momentos piores. Acredito que nós não cometeremos os mesmos erros de 2006, quando o PT lançou candidatura própria. Traba­lha­remos a exemplo de 2010. Na­que­le ano toda a mídia, toda a im­pren­sa, os articuladores políticos, apostavam em um rompimento do PT com o PMDB e mantivemos a aliança. E, com Iris Rezende, perdemos por 170 mil votos, menos de 2%.
 
Cezar Santos — Por isso mesmo que a imprensa fica em cima da oposição. O sr. acha que é perseguição, mas é que a oposição, com esse histórico de rompimento, está sempre sendo surrada. Por isso o interesse da imprensa.
 
Elder Dias — A história é que a imprensa ou qualquer um que analisar — e o próprio PT sabe disso — vai ver que o PMDB não será vice do PT. Essa possibilidade não existe. A possiblidade de ter um Júnior Friboi ou Iris Rezende, qualquer um, como vice do PT, não existe. O PMDB não aceita, pela tradição — podemos dizer até pela arrogância política, por ser o “partidão”, o “maior partido de Goiás”. A base peemedebista no interior, os prefeitos, os deputados não aceitam ser vice do PT. Então, esse cenário estaria descartado. A partir daí, como o PT trabalhará uma candidatura?
Em 2008 se dizia isso também, quando nós queríamos apoiar Iris Rezende. Não faça comparativos no PT com essa certeza. O PT é um partido que tem um debate político intenso dentro de suas instâncias. Temos um núcleo, que é uma célula de nove filiados nos bairros, nos segmentos organizados; depois, diretórios zonais por região — são dez diretórios regionais em Goiânia; depois, temos o diretório municipal e ainda a plenária municipal. Mais ainda, depois temos um congresso municipal, que elege os delegados, pegando o voto de todos os filiados. Nós temos um processo de efervescência. Por­tanto, nenhuma decisão no PT é tomada sem passar por essas instâncias. Cúpula nenhuma do PT, sozinha, decide nada. Em 2008, quando da unidade do PT com o PMDB indicando Paulo Garcia como vice de Iris, todos afirmaram que nós estávamos blefando e quando nós chamamos o voto deu um resultado de aliança. Não subestime a democracia interna no PT. É uma democracia interna que pulsa, que é viva.
 
Cezar Santos — Mas isso não é tão verdade, pois, no Maranhão, Lula impediu que o PT tivesse candidato, exatamente para não atrapalhar a eleição de Roseana Sarney (PMDB).
Sim, mas houve um debate intenso no Maranhão e uma decisão da direção nacional de privilegiar uma unidade em torno da presidente Dilma que era sustentada por José Sarney, que carregava o PMDB. Eu costumo dizer o seguinte: cada dia que passa, cada processo eleitoral, as eleições têm uma conotação mais federalizada. Existe uma decisão no debate, em torno do projeto nacional; fechado o projeto nacional, vem um debate nos Estados. Para consolidar um leque de possibilidades em torno do projeto nacional, há concessões nos Estados. No caso específico do Maranhão prevaleceu a federação, prevaleceu o debate nacional. Foi feita uma concessão. Lá, se não fosse feita a aliança com o PMDB, haveria intervenção. Já no caso específico de Goiás, nós estamos seguindo o projeto nacional. Qual é o projeto nacional? Aliança com o PMDB. Por isso, quando você insiste nessa tese de ruptura, eu lhe digo: nós temos um aliado preferencial, que é o PMDB, que tem o vice da presidenta Dilma [Michel Temer] e seis ministérios importantes; aqui, tem o vice do prefeito Paulo Garcia [Agenor Mariano]. Eu te digo: certamente nós continuaremos unidos com o PMDB e vamos trabalhar a unidade das oposições em Goiás.
 
 
Deputado Luis Cesar Bueno fala ao Jornal Opção: “Quem estabilizou a economia foi o governo do presidente Lula”
 
Elder Dias — O sr. explicitou a democracia interna do PT, o que é verdade, porém a questão não é o PT. A questão é o PMDB. Então, não existe um equilíbrio nessa relação.
Mas o PMDB também segue orientações da direção nacional. Na composição nacional, o PT faz concessões, mas o PMDB também faz concessões. Nós pedimos concessão ao PMDB para disputar as eleições no Rio de Janeiro, no Rio Grande do Sul, em Minas Gerais. Até na divergência há um entendimento, “olha, neste Estado aqui nós vamos divergir”. Porém, há um discurso federal. Há um discurso da Federação.
 
Euler de França Belém — O sr. mostra a crença que Vanderlan Cardoso pode apoiar a candidatura do PT e do PMDB. Entretanto, o partido dele, o PSB, já está dando mostras de que irá fazer intervenções em Estados onde o PSB se aliará ao PMDB e ao PT.
É uma situação difícil. Acredito que a candidatura do ex-prefeito do Senador Canedo Vanderlan Car­doso é um projeto que vem de oposição ao governo do Estado e que poderia estar conosco, mas tem esses limitadores. No Ceará, houve uma intervenção recente no PSB. É esse o dado. Acredito que em Goiás existe um sentimento muito grande de apresentar para um projeto alternativo ao Estado. Esse sentimento também envolve Vanderlan, nós podemos estar dentro de uma ação articulada.
 
“O projeto do PSDB está sucateado”
 
Cezar Santos — A candidatura do governador Eduardo Campos (PSB-PE) preocupa o PT?
Preocupa. Toda candidatura que nos tire votos, principalmente em um Estado importante como Pernambuco, preocupa. Será uma campanha muito disputada. Nós temos de prestar contas de três mandatos. Estamos preparados para isso, porque o Brasil que nós vivemos hoje é melhor do que o Brasil de 10, 12, 15 anos atrás. É esse debate que nós faremos. Nós temos um segmento da juventude muito grande que nem votava quando o presidente Lula assumiu o governo. Será uma campanha onde o debate político tem de prevalecer. Dentro do PT eu tenho defendido a tese de que nós temos que intensificar muito o processo de formação política. Nós distribuímos 1,5 milhão bolsas de estudos do ProUni, onde pessoas que estavam fora do processo entraram através na universidade por meio do ProUni. Aí, pergunta-se: essas bolsas de estudos geraram quantos ativistas políticos de esquerda no movimento estudantil? Nós investimos na formação política e ideológica desses novos estudantes, conseguimos fazer uma interlocução como se fazia antigamente nas universidades? Não. O governo federal distribuiu mais de 2 mi­lhões de casas, construiu milhares de conjuntos habitacionais em to­do o Brasil, com o programa Mi­nha Casa Minha Vida, muito presente em Goiás. Qualquer cidade a que você for aqui tem um conjunto habitacional do Minha Casa Mi­nha Vida. Pergunta-se: quantas as­sociações de moradores, de cunho ideológico e político-organizadas nós conseguimos fazer? Muito pouco, quase nenhuma. A capacidade de organizar politicamente os beneficiados dos programas sociais do governo não foi muito intensa. Por isso, durante a campanha nós deixaremos, na propaganda eleitoral, nos instrumentos de comunicação de massa, muito claros os nossos programas e os programas do governo anterior. O retrato do Brasil de hoje e o retrato do Brasil de mais de uma década atrás.
 
Cezar Santos — O sr. diz que os programas do governo federal têm que de ser instrumentalizados a favor do partido?
Não. Nós temos de discutir a formação ideológica da nova classe média. Esse debate está sendo feito, porque a nova classe média, que foi formada pelos programas sociais, com as conquistas do governo, foram as camadas que mais ascenderam socialmente e é a camada que mais faz oposição ao nosso governo. Eu acho que carece aí, não a instrumentalização e partidarização, mas o debate político, o debate dos programas do governo. O PT tem que investir na formação de seu eleitorado.
 
Cezar Santos — É verdade que o sr., mais o deputado estadual Francisco Gedda (PTN) e a deputada Iris Araújo (PMDB) foram até a presidente Dilma para reclamar dos recursos que o governo federal estava mandando para o governo de Goiás e de que isso estava atrapalhando os planos da oposição para as eleições aqui?
Eu fui pedir recursos para Goiás. Fui até a ministra Ideli Salvatti [Relações Institucionais] para pedir a retomada das obras do aeroporto de Goiânia e a duplicação da BR-060. O resto é boato e mentira.
 
Cezar Santos — O sr. só responde por si mesmo sobre essa história?
Sim, desconheço essa história, é a primeira vez que estou ouvindo falar disso.
 
Euler de França Belém — O governador Marconi Perillo, se vencer as eleições, ficará 16 anos no governo e passa a ser o governador que mais tempo ficou no poder. Em 1998, uma de suas principais bandeiras foi a crítica dos 16 anos de poder do PMDB. Mas, em 2014, tanto o tempo quanto o próprio caso Cachoeira irão contra ele. Qual desses dois fatores vai abalar mais a campanha de Marconi, que hoje lidera as pesquisas?
Nenhum governador jamais conseguiu chegar a quatro mandatos. Nem Iris Rezende, nem Pedro Ludovico Teixeira. Então, acredito que isso também não vá ocorrer com a atual gestão. O que vai prevalecer será o debate de projetos. O Estado precisa reduzir a violência e garantir a infraestrutura para que os investimentos ocorram. Hoje, se um empresário quiser investir em um empreendimento de grande monta ele não conseguirá nem a autorização concernente à energia elétrica. Assim, o que enfraquecerá o governador será o debate de projetos. O projeto desenvolvido pelo PSDB está sucateado e é necessário que a oposição ofereça um novo modelo de gestão para ganhar as eleições.
 
Euler de França Belém — Mas por que, mesmo com todo esse desgaste, a figura do governador ainda aparece em primeiro nas pesquisas?
Ele está com a máquina do governo na mão. Mas as pesquisas também mostram que a avalição do governo não é positiva. É o 17° governador no ranking nacional. Em recente matéria publicada no jornal “O Estado de S. Paulo”, ele é apontado como um dos governadores na linha de risco.
 
Euler de França Belém — As pesquisas mostram que a popularidade do governador é ascendente e a rejeição, decrescente.
A avaliação do governo é ascendente. Agora, um governo que tem quase R$ 15 bilhões, injetados pelo governo federal em curto prazo, para desenvolver ações estruturantes, poderia ter uma desenvoltura muito superior à atual.
 
Euler de França Belém — Mas o fato de a popularidade do governador estar crescendo, principalmente em Goiânia, não preocupa a oposição?
Aqui voltamos à questão: quem tem a estrutura de governo tende sempre a estar na frente. O que deveria ser discutido é o fato de o ex-prefeito de Goiânia Iris Re­zende estar fora do governo e, em muitas pesquisas, aparecer quase na mesma linha do atual governador. Então, há uma contraposição. Um governador que gastou R$ 210 milhões em 2013, apenas com mídia, aparecer praticamente empatado com o ex-prefeito que está fora de todas as estruturas do Estado há mais de quatro anos.
 
Frederico Vitor — Ao chegar março ou maio, se o PMDB comunicar ao PT que entende que Júnior Friboi é o melhor nome para ser governador de Goiás. Hipoteticamente, se isso acontecer, o sr. avalia que o Friboi é o melhor nome, ele tem capacidade para ser governador de Goiás?
Tem. Iris tem, também. Assim como Antônio Gomide, Paulo Garcia. O que nós precisamos é de maturidade suficiente para não construir a ruptura, mas sim a unidade. Nós vamos ter.
 
Elder Dias — Voltando a uma preocupação que o sr. colocou nessa questão da formação, essa nova classe que surgiu — e eu concordo que há uma ascensão forte dessa classe…
(interrompendo) Com o avanço do País, porque nas estruturas políticas do passado quanto ao desenvolvimento econômico, ela jamais teria essa ascensão. A família que tinha um carro hoje tem três. A família que não tinha ne­nhum, hoje tem um. Isso mostra poder de consumo. Praticamente todos tem acesso a habitação, transporte, informação, ensino superior etc.
 
Elder Dias — Sim, mas tem uma questão fundamental que não foi trabalhada pelo PT e seria importante para influenciar diretamente essa classe que ascendeu. Uma coisa é ascensão econômico-social, outra é ascender como pessoa, quanto à formação pessoal, à educação. Não houve, a meu ver, um tempo necessário para que essa classe ascendesse também dessa forma. A questão da educação ficou para trás, não evoluiu.
Na prática, a esquerda abdicou do modelo marxista, de formação de quadros, e isso teve uma interferência muito direta na interlocução da conscientização desses segmentos intermediários que formam opinião nessa classe média. Por outro lado, nós não desenvolvemos um modelo chavista de comunicação, que é muito personalista. A propaganda chavista é um culto à personalidade. O PT desenvolveu um modelo republicano — alguns falam republicano ao extremo, haja vista, por exemplo, a relação com Goiás. Marconi Perillo jamais poderá reclamar do governo do Partido dos Trabalha­do­res na relação com nosso Estado.
 
Cezar Santos — Mas isso não é vantagem, não. O governo federal é de todos os Estados, não só dos aliados.
Não. Não. Fernando Henrique Cardoso fez o mesmo com Marconi?
Vamos comparar? Foram R$ 6 bilhões para a Celg e a Celg continua ruim. Tem de salvar a Celg. Faltou energia no Centro na quarta-feira, 8; às 2 da tarde, faltava energia lá e em outros barros de Goiânia. No interior, o governo Marconi apanha por causa da Celg, porque o produtor de lá fica dois dias sem luz, três dias sem luz. O produtor perde o leite e não existe propaganda que mude essa imagem! (enfático) A Celg foi um problema no início do governo Mar­coni e vai ser um problema muito maior no final do governo dele.
 
Euler de França Belém — Não estou entendendo: a Celg não está sendo comandada pela Eletrobrás?
Não. Até hoje o governo do Estado não transferiu a Celg para a Eletrobrás. Tentou fazer, mas quando foi fazer, a média salarial dos servidores da Celg estava acima da média nacional. Foi solicitada, em cima de toda estrutura, um choque de gestão para adequar a Celg ao sistema nacional elétrico nacional. Isso não foi feito até hoje.
 
Euler de França Belém — Mas o que está fazendo aquele presidente [Leonardo Lins], então? Ele veio para cá como representante da Eletrobrás.
O acordo que foi feito, inicialmente, antes da transferência, obrigava a Celg a ter uma gestão profissionalizada. A indicação da diretoria da empresa ficou por conta do governo de Goiás, mas a Celg não está com a Eletrobrás.
 
Euler de França Belém — E agora? O que vai acontecer com a Celg?
Precisa de investimento. O governo do Marconi pegou R$ 6 bilhões e não resolveu o problema e agora quer devolvê-la, de novo. Quer vender, de novo, o problema. O governo federal não entra nesse problema mais. Ele que resolva o problema da Celg.
 
Euler de França Belém — O problema da Celg é um problema do Marconi?
É do governo do Estado. Marconi está tentando entregar a Celg. A nova jogada é valorizar a Celg. Como se valoriza uma empresa que tem apenas mais um ano de concessão? Daqui um ano, sim, a concessão do serviço de distribuição de energia elétrica acaba e não a Celg. A Celg fica por conta do governo, a concessão volta para o governo federal. Essa é a questão.
 
Euler de França Belém — O sr. considera que as OSs, como estão sendo implantadas em Goiás, são uma forma de privatização da saúde?
Da forma com que está sendo feita, sim. As organizações sociais são entidades de direito privado. Nós comprovamos na Assembleia Legislativa, por meio de denúncias e farta documentação, irregularidades na contratação de pessoal, na lavanderia do Hospital de Urgências de Goiânia (Hugo) — com superfaturamento em que a lavanderia gastava mais do que o setor de antibióticos. O modelo adotado aqui já mostrou em outros Estados que não deu certo. O que é preciso ser feito na área da saúde são investimentos nas unidades. Não podemos mais conviver com a situação em que os prefeitos do Sudoeste goiano, do Norte, da Região da Estrada de Ferro, do Vale do Araguaia tenham de fazer investimento não em saúde, mas em ambulâncias e casas de apoio, constantemente superlotando as unidades de Goiânia com pacientes do interior. O que o governo estadual precisa fazer é cumprir o compromisso de campanha de construir os hospitais de urgência da região Norte e da região Nordeste, am­pliar o atendimento na região Sudoeste e nas demais regiões do Estado. Ou seja, temos de atender o paciente em sua região, sem trazê-lo para Goiânia. Há recursos do Ministério da Saúde para isso. O que é preciso é ter vontade política para entender que saúde é um instrumento público de prestação de serviços, não privado. O governo federal não vai fazer investimento em unidades que são mantidas por organizações sociais.
 
Euler de França Belém — Mas o público que busca os hospitais quer saber é se o atendimento é de boa ou má qualidade. A oposição tem informações sobre se há má qualidade no atendimento nessas unidades em que agora estão atuando as OSs?
A qualidade do atendimento no setor público depende da motivação do pessoal. O servidor público precisa ter um plano de carreira revitalizado e ter empolgação para o trabalho. Quando o presidente Lula assumiu o governo havia décadas em que não havia concursos para o setor público. A máquina pública estava totalmente sucateada. Houve um investimento no aparelho do Estado pelos gestores e várias funções de chefias e direção, que eram de cargo comissionado, passaram a ser de carreira. Em um Estado que enche a máquina com servidores comissionados e terceiriza a prestação de serviços por meio de contratos com OSs não vai ter, por parte do servidor público da saúde, uma motivação para o trabalho. Precisa­mos profissionalizar o aparelho do Estado e fazê-lo eficiente na prestação de serviço à população, não apenas na saúde, mas em todas as áreas estratégicas. Esse conceito — que está crescendo muito em Goiás, como no debate para a privatização da Ceasa [Centrais de Abaste­cimento de Goiás S/A] — de que o Estado é ineficiente para conduzir a gestão é um conceito atrasado, da década de 80, da época do Consenso de Wa­shin­gton, da famigerada onda neoliberal que derrotou os governos tucanos no Brasil. O que se prega hoje é a eficiência. A crise econômica de 2008, quando o Estado norte-americano teve de investir na GM, na Chrysler e salvar outras grandes em­presas do setor automobilístico mostrou que o discurso neoliberal é um discurso falido. Não vai ser o governo tucano de Goiás que vai conseguir restabelecer esse debate. (enfático)
 
Euler de França Belém — Vou citar alguns nomes para que o sr. analise: o atendimento no Hugo, no HGG [Hospital Geral de Goiânia], no HDT [Hospital de Doenças Tropicais], no Materno-Infantil e no Crer [Centro de Reabilitação e Readaptação Dr. Henrique Santillo] são ruins?
Continua ineficiente. Houve uma redução da quantidade para melhor a qualidade. Isso faz com que se amplie o número de excluídos do serviço de saúde.
 
Cezar Santos — E o atendimento nos Cais [centros de assistência integral a saúde, administrados pela Prefeitura de Goiânia] e Ciams [centros integrados de assistência municipal à saúde], é bom?
O sr. poderia ir a um Cais.
 
Cezar Santos — Fui ao da Serrinha [em frente ao campo do Goiás], domingo passado, durante uma crise renal, e não tinha remédios nem ninguém para me atender.
Já eu tenho tido boas informações, pelo que tenho perguntado às pessoas. De forma geral, o atendimento nos Cais tem melhorado significativamente. Goiânia tem sido um exemplo nas políticas de saúde nas áreas locais. E isso enfrentando todo o sucateamento da estrutura em função de uma demanda que não é só da capital, mas da região metropolitana e do interior, com pacientes não conveniados, mas que Goiânia tem de atender. Houve ações importantes. Por exemplo, foram abertas 873 vagas para médicos; foi entregue uma unidade de pronto atendimento (UPA), no Jardim Itaipu; várias unidades estão sendo construídas nos bairros; há um programa de atendimento localizado que está sendo muito bem feito; a Maternidade Dona Iris tem cumprido seu papel; e a Prefeitura, visando fazer sua parte no tratamento de urgências, está planejando implantar um hospital de urgências. Enfim, as ações na área de saúde de Goiânia melhoraram significativamente, apesar da explosão da demanda e da redução do número de atendimentos nas unidades do Estado.
 
Euler de França Belém — Estão dizendo que a violência caiu em Goiás. Isso procede?
Se caiu, não foi em Goiás. Pelo menos, os índices mostram, isso sim, que houve uma explosão da criminalidade. O número de pessoas mortas por homicídio em 2010 era inferior a mil. Segundo os dados apresentados à imprensa pela própria Secretaria de Segurança Pública, em 2013 foram 2.576 vítimas de homicídio. Ou seja, mais do que dobrou o número de 2010. Vou mostrar a gravidade: a população de Ipiranga de Goiás tem 2.844 habitantes; a população de cidades como Panamá, Córrego do Ouro, Buriti de Goiás e Adelândia tem entre 2.400 e 2.600 habitantes. Isso significa que, se reunirmos todas as pessoas mortas por homicídio,seria como dizimar, exterminar a população de uma dessas cidades, tamanha a gravidade. As cidades goianas eram hospitaleiras, tranquilas, pacatas, no sentido da relação com a violência e o crime. Hoje o crack está presente em 205 das 246 cidades do Estado. Este governo do PSDB, que comanda o Estado de Goiás, foi eleito com uma proposta muito consistente de reduzir a criminalidade, combater o tráfico de drogas e instituir os chamados Credeqs [centros de referência e excelência em dependência química]. Até hoje isso não saiu do papel. Estamos muito preocupados e, por sucessivas vezes, usei a tribuna da Assembleia Legislativa para denunciar a explosão dos índices de criminalidade no Estado. Todas as vezes que fomos à tribuna a bancada do PSDB acusava nós, do PT e da esquerda, de estar fazendo o discurso de defesa dos direitos humanos. Sucessivas vezes usavam o chavão de que “bandido bom é bandido morto”. A questão é que, lendo os índices, quem morre não são os bandidos, que continuam soltos. Quem está morrendo são os filhos do povo, são jovens de 15 a 24 anos, são os filhos dos trabalhadores que estão sendo vítimas dos homicídios. É uma ação muito preocupante, que exige uma mobilização da sociedade para desenvolver uma campanha pela paz para reduzir os índices de violência. Outra questão é em relação ao número de furtos de veículos. Em 2013, foram 9.119 veículos furtados no Estado de Goiás. Uma frota significativa em relação ao total emplacado durante um ano. Isso reflete no valor dos seguros de veículos. Goiás é um dos Estados onde o seguro é dos mais caros, justamente porque as seguradoras entendem que o Estado, principalmente a região metropolitana, é uma área de altíssimo risco. A população paga, no seguro, por essa falta de segurança.
 
Euler de França Belém — O sr. fez bem em trabalhar com dados específicos. Mas, por outro lado, se o sr. omitisse o nome do Es­ta­do, alguém de Sergipe, ou do Ma­ra­nhão, ou de São Paulo, ou da Ba­hia, qualquer um desses poderia dizer que o sr. estaria se referindo ao Estado deles. Quando o mi­nistro da Justiça [José Eduardo Cardozo] vem a público e fala que sua pasta errou ao não aplicar o su­ficiente em presídios, o sr. não acha que está fazendo uma crítica mais política do que independente?
O fato de certos Estados, como o Rio de Janeiro, que tem uma tradição estatística de figurar entre os que são mais violentos e de maior consumo de drogas não pode ser referência para comparação com Goiás. É algo muito diferente, existem alguns focos que precisam ser enfrentados. No ponto de vista da generalidade da ação de combate à violência, os dados apresentados pela Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp) indicam que os investimentos sociais no Brasil, que reduziram significativamente a miséria e a fome e garantiram emprego e renda, deram também mais segurança às famílias. Milhões de brasileiros ascenderam à classe média e outros saíram da pobreza absoluta. Isso são ações que com certeza ajudaram a conter a violência. É bom observar que não estou fazendo de Goiás uma ilha. Estamos integrados em um contexto, no qual somos um dos três ou quatro Estados em que a violência mais cresceu. Isso precisa ser analisado e enfrentado, inclusive com apoio do governo federal. Alguns governadores e prefeitos solicitaram a presença da Força Nacional de Segurança. Por aqui, ela foi chamada para fazer a conclusão de alguns inquéritos na área da Polícia Judiciária, o que está sendo realizado com eficiência. Quando explodiu a onda de crimes no Entorno do DF, a Força Nacional foi chamada e fez um bom trabalho. É importante ressaltar que o governo federal é um parceiro e não um competidor na hora de tratar as questões da segurança pública. É preciso entender isso, que a responsabilidade na questão da segurança pública é dividida e o governo federal tem garantido o apoio necessário. Vamos lembrar que o atual governo do Estado devolveu recursos para construir nove presídios. Esses recursos tinham vindo em 2009 e eu fui relator desse processo. O próprio Tribunal de Justiça chegou a questionar o porquê estariam devolvendo esses recursos federais. A concepção da segurança pública no Brasil foi mal elaborada na Constituição Federal. Os países desenvolvidos municipalizaram a área. Nos Estados Unidos, o xerife e o juiz são eleitos juntamente com o prefeito. Se a segurança pública vai mal, o prefeito não é reeleito, não ganha eleição. Na Europa há os comissariados de polícia local. Então, a população participa do processo de segurança pública localmente, com ações do prefeito. Aqui no Brasil, se tivéssemos feito constitucionalmente a unificação das polícias, civil e militar, e a municipalização da segurança pública, não teríamos uma violência tão desencadeada como a de hoje. O policial tem de ficar junto à sua comunidade.
 
Cezar Santos — O ex-presidente Lula disse uma vez que não iria construir presídios, mas escolas, como se uma coisa eliminasse a outra. Uma visão tacanha.
O governo federal não constrói presídios. Ele faz convênios, repassa o dinheiro aos Estados e estes constroem. Os presídios federais de segurança máxima sob administração do governo federal estão todos eles sólidos e em funcionamento. O que não pode acontecer é enviar recursos e os Estados não conseguirem desenvolver projetos e devolver. Isso infelizmente aconteceu em Goiás e também em outros Estados.
 
Cezar Santos — Estranhamente, a atenção do governo federal para os presídios só foi despertada a partir do momento em que petistas foram para a cadeia.
Não é verdade, isso sempre foi denunciado pelas entidades. A situação carcerária no Brasil é muito ruim, um problema histórico. Nosso principal presídio [Complexo Prisional Odenir Guimarães, antigo Cepaigo] foi construído ainda pelo governador Mauro Borges, no início da década de 60. Agora, como existe uma onda de privatização em Goiás, fala-se também em fazer isso no sistema prisional, no cuidado aos presos.
 
“Nosso plano econômico para o País é muito bom”
 
Euler de França Belém — O sr. é contra essa privatização dos presídios?
Não sou contra privatização alguma — desde que haja contrapartida da iniciativa privada. Sou a favor da entrega da concessão. Se a iniciativa privada tirar recursos de seu caixa e construir os presídios com recursos próprios, acho que fica até mais barato fazer a manutenção por consumo per capita do preso. O que não pode acontecer é como está programado pela Agetop [Agência Goiana de Transportes e Obras] com a privatização das rodovias estaduais. Elas estavam abandonadas e esburacadas e a presidenta Dilma Rousseff liberou para o governador as recuperar. Depois que as rodovias foram totalmente reconstruídas, falam em privatização pagando pedágio de 8 reais em cada trecho de 50 quilômetros. Quem não quer um negócio desses, se é só colocar um guichê no início do trecho e cobrar? Quanto de investimento dessa empresa houve na recuperação daquela rodovia? Zero. Aí não é privatização, não é entrega da concessão, mas, sim, uma parceria totalmente desproporcional para o poder público. É bem diferente do que a presidenta Dilma está fazendo, em que a iniciativa privada terá de investir bilhões de reais na duplicação e na extensão da malha rodoviária para, na sequência, em 15, 20, 25 anos, cobrar o que foi investido. É a forma que está sendo feita nos aeroportos e nos portos, onde há um investimento pesado da iniciativa privada com o consequente retorno em forma de pagamento do pedágio. É bom ressaltar que o processo assim desenvolvido não é privatização, mas uma concessão do serviço. Mas há alguns setores para os quais não há nem essa possibilidade: eu acho que o poder público tem de assumir saúde, segurança e educação. Imagine se começassem a privatizar as escolas estaduais, ou os hospitais públicos, como o governo de Goiás está fazendo. Na Bahia, o governo é do meu partido, mas sou contra o processo que estão fazendo de transferência da saúde para as OSs [organizações sociais]. Saúde, educação, segurança e segurança nacional são instrumentos estratégicos do aparelho do Estado que, pelo bem dele próprio, não devem ser repassados.
 
Frederico Vitor — Continuando a falar de segurança pública, no Brasil, em 2013, foram registrados 54 mil homicídios, números de guerra…
Quase 3 mil só em Goiás.
 
Frederico Vitor — Exatamente. Fala-se sempre na questão de unificação das polícias. De que forma isso pode ocorrer e como pode ser redefinido o papel da segurança pública no Brasil?
Vou ampliar sua linha de raciocínio, em função do papel do Congresso Nacional, também. A Constituição brasileira foi elaborada para servir a um governo parlamentarista. Posteriormente, houve um plebiscito [em 1993] e o resultado vitorioso foi pelo governo presidencialista. Com isso, houve uma desestruturação do nosso texto constitucional. Com a ausência de um regime parlamentarista e uma Cons­tituição frágil, não conseguimos avançar nas reformas. É inadmissível, por exemplo, que não haja uma reforma tributária diante do número expressivo de tributos que se cobra hoje. Vi com bons olhos as manifestações de junho. O povo foi às ruas pedir melhor qualidade dos serviços públicos. Ninguém pediu melhor qualidade de vida, mais empregos, melhor salário ou o fim da miséria. Basicamente, exigiram um basta à corrupção e a melhoria na qualidade dos serviços públicos. Para melhorá-los, especificamente no caso da segurança pública, é preciso fazer reformas estruturais: é preciso discutir a unificação das polícias e a municipalização da segurança, por exemplo. O presidente Lula enviou ao Congresso, em 2009, o projeto de reforma tributária e o de reforma política. Tanto um como o outro ficaram presos no Congresso até hoje, não andam. O que precisamos, em minha opinião, é de um Congresso específico para fazer uma revisão do texto constitucional. Não dá mais para ter o sistema de segurança pública com as leis que aí estão, principalmente em questões como a maioridade penal, menoridade, o calendário dos tempos de prisão etc. Da mesma forma, não dá para ter um sistema tributário com 32 tipos de impostos. Para mim, seriam necessários apenas três tipos para um país: um imposto sobre a renda, para a União; um sobre o consumo, para o Estado; e um sobre a propriedade, para o município. Não precisaria de mais nada, só isso. Aí o que iríamos discutir seria a forma de distribuição. Não dá para ir de novo para uma campanha política — para eleger presidente, governadores, senadores, deputados federais e estaduais — em que o poder determinante de novo será o econômico. Precisamos de financiamento público de campanha urgente, com voto em lista, discutindo se será um voto em lista misto ou fechado. O País precisa das reformas, daquelas reformas pelas quais o povo foi às ruas ainda no governo João Goulart [década de 60], na época das Diretas Já [década de 80], na construção de uma Constituição parlamentarista — e vivemos em um presidencialismo. Eu esperava que o Congresso Nacional, ouvindo as vozes das ruas de junho, se atentasse aos projetos que o presidente Lula e a presidenta Dilma já colocaram na pauta do Congresso, mas que nunca saem de lá! (enfático)
 
Cezar Santos — Mas o governo tem um “trator” no Congresso…
O PT não tem maioria ideológica no Congresso, ao contrário do governo Fernando Henrique Cardoso, que tinha. O conceito republicano e de formação de governo de coalizão, desenvolvido tanto pelo presidente Lula como pela presidenta Dilma, é muito mais amplo que o de FHC. José Sarney [presidente entre 1985 e 1990], por exemplo, fez o Plano Cruzado, que durou um ano e elegeu 26 governadores; FHC [presidente entre 1995 e 2002] fez o Plano Real, que elegeu 19 governadores. Nosso plano econômico, em vigor, é muito superior, mas nunca o usamos politicamente e nunca conseguimos eleger mais do que cinco governadores. Isso é muito debatido no PT, ainda não soubemos capitalizar esse resultado. 
 
Cezar Santos — Mas o Plano Real não tem influência na economia atual?
No fim do governo FHC a inflação era altíssima. Quem a estabilizou foi o governo do presidente Lula, por meio de políticas rígidas baseadas em uma âncora cambial desenvolvida pelo então presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, e o então ministro da Economia, Antonio Palocci.
 
Euler de França Belém — Então temos de rever a história, não foi Fernando Henrique Cardoso quem controlou a inflação?
Fernando Henrique estabeleceu as linhas para o Plano Real, mas não conseguiu conduzi-las. Houve uma estabilidade no começo, mas posteriormente, no último ano, ele entregou com 27% de inflação ao ano. Com o governo do PT, chegamos a ter inflação de 2% ao ano e depois nunca chegou a mais do que 6%.
 
Euler de França Belém — O sr. omite uma informação, a de que o PT, apesar de não eleger governadores nos Estados, fez um pacto faustiano com algumas elites estaduais — a família Sarney no Maranhão, Jáder Barbalho (PMDB) no Pará, Renan Calheiros (PMDB) em Alagoas —, com o argumento da governabilidade. Setores do PT têm criticado sempre isso, de forma veemente.
É por isso que as reformas estão travadas no Congresso Nacional. É por isso que não temos reforma política nem eleitoral nem tributária nem do sistema prisional nem qualquer outra. É o preço que estamos pagando, em 12 anos de governo, com uma governabilidade muito ampla com setores muito conservadores. Isso foi o que levou a população às ruas, em junho. A presidenta Dilma tentou retomar as rédeas depois dessas manifestações, encaminhando várias medidas ao Con­gresso, entre elas a da reforma política, o que não avançou. Tenta­mos até o último minuto fazer a reforma política, por meio de um Congresso Constituinte específico ou uma reforma eleitoral mais ampla, mas não conseguimos. Não conseguimos porque temos um Congresso conservador, que não quer as mu­dan­ças. A Lei de Licitações é tão ul­tra­passada que, se o presidente Jus­celino Kubitschek fosse construir Brasília hoje jamais o faria em quatro anos. Talvez não fizesse nem o projeto nesse tempo. (risos) Pre­ci­sa­mos agilizar as estruturas do Estado e, para isso, precisamos de um novo texto constitucional. Então, o preço dessas alianças que o PT tem feito está realmente muito alto.
 
Euler de França Belém — O filósofo Marcos Nobre e o sociólogo Francisco de Oliveira disseram que o PT está repetindo a política de FHC, mas está colocando na cabeça das pessoas que não é possível fazer outra política. Oliveira diz que o PT passa a ser uma espécie de gerente do capitalismo, com o dominado fazendo o jogo do dominante.
Nós vivemos em um país capitalista e não estamos em transição para qualquer outro modelo utópico. O Partido dos Trabalhadores não assumiu a gestão para conduzir ao socialismo, mas para garantir uma melhor qualidade de vida, uma melhor renda, trabalho, desenvolvimento. Se formos analisar o manifesto de fundação do PT, todas as nossas bandeiras históricas que sempre defendemos conseguimos cumprir — na educação superior e na educação básica, na área social, na estabilidade econômica do País, na soberania nacional. Nunca tivemos um país tão soberano como agora. O PT cumpriu seu papel histórico. Do ponto de vista de conduzir a sociedade a um estágio mais utópico, mais desenvolvido, houve uma crise do marxismo e do socialismo real, com a queda do Leste europeu. A própria esquerda mundial não tem um modelo, hoje. O PT é um coadjuvante da formulação de um novo projeto na América Latina, que tem o Brasil como expoente. Isso ainda está em gestação. Hugo Chávez tentou na Venezuela, Evo Morales na Bolívia etc. Com a queda do Leste europeu não dá para fazer um discurso ideológico sobre modelo de sociedade. O real é o que vivemos no capitalismo. E o PT de um país capitalista como o Brasil, vai procurar, dentro de suas estruturas cumprir seu programa, para fortalecer a democracia, o estado democrático de direito e propiciar às pessoas uma melhor qualidade de vida. Se enveredarmos por esse debate — e aqui relembro Norberto Bobbio [filósofo italiano] em “O Futuro da De­mocracia”—, estaremos trabalhando ações de enfraquecimento do sistema democrático e do poder real de conduzir o real que existe, que é um governo de um país capitalista.
 
Euler de França Belém — O sr. falou sobre a questão da Ceasa. O que há exatamente com a Ceasa?
A Ceasa era uma empresa do governo federal, com a extinta Cobal. Posteriormente, a Cobal virou a Conab. Nesse processo de transferência de Cobal para Conab, houve um pedido do governo de Goiás para ter o controle da Ceasa. Como naquela época vivíamos a onda neolibera

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